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Eleições: Save the date

A pandemia do Covid-19 restringiu a aglomeração e a reunião de pessoas, gerando, até os dias atuais, remanejo de datas e modos dos compromissos da vida cotidiana. Tão grande as consequências causado, que foi decretado em março pelo Congresso Nacional o estado de calamidade pública no país, por meio do Decreto Legislativo nº 6/2020, publicado em de 20 de março de 2020, e, desde então, inúmeros atos normativos foram editados para que pudesse se estabelecer o mínimo necessário para se passar por essa pandemia.


As eleições municipais de 2020 não passaram imunes, foram afetadas e trouxeram à discussão temas de grande polêmica.


Com a recomendação de autoridades sanitárias nacionais e internacionais para se evitar ao máximo as aglomerações, em razão da alta transmissibilidade do vírus, as eleições foram alvo de debate, discutindo-se acerca do adiamento das datas que, normalmente, ocorrem no primeiro domingo e no último domingo de outubro (art. 29,II, Constituição Federal de 1988), ou, ainda, acerca da prorrogação dos mandatos dos atuais gestores públicos municipais, para o ano seguinte, de modo que permaneceriam no cargo, não havendo assim eleição para o presente ano.


O imbróglio jurídico gira em torno de dois grandes dilemas: 1) possibilidade de prorrogação de mandato eletivo e 2) alteração de data das eleições.

Pois bem, os cidadãos eleitores, quando comparecem às urnas para eleger um candidato, eles o elegem para um prazo determinado de 4 anos no caso de prefeito municipal (art. 29, I, Constituição Federal de 1988). Dá-se, então, o nome de batismo popular (termo cunhado pelo Ministro do Supremo Tribunal Federal Luís Roberto Barroso), ou seja, há uma legitimidade popular pois o povo o elegeu por meio do voto direto.


Com efeito, quando se prorroga determinado mandato para período superior ao inicialmente previsto, tem-se um mandato ilegítimo. Assim, uma alteração de regra do jogo desse tipo, coloca em dúvida o apoio ao gestor que, em bom português, acaba se perpetuando no poder indevidamente.


A Constituição Federal preceitua o voto periódico como uma cláusula pétrea (art. 60, §4º, II, Constituição Federal de 1988), prevê, ainda, a legitimidade do povo para votação direta (art. 1º, parágrafo único, Constituição Federal de 1988), estipula as datas para ocorrência das eleições (art. 29,II, Constituição Federal de 1988) e não prevê possibilidade de prorrogação de mandato sem eleições.


Por outro lado, a alteração, excepcional, das datas das eleições, encontra, a princípio, barreira no princípio eleitoral da anualidade (art. 16, Constituição Federal de 1988), que significa a observância do intervalo de um ano, após a entrada em vigência de determinada regra que altere o processo legislativo, para que ocorra sua aplicação na eleição seguinte.


Com efeito, alteração de data, significa alteração de processo eleitoral e, por isso, o que parecia ser solução, se torna obstáculo. Posto as impossibilidades fáticas, deve-se perseguir uma solução para contornar essa situação pontual.


Como sabido, cláusula pétrea não pode ser modificada, nem mesmo por Proposta à Emenda Constitucional (art. 60, §4º, Constituição Federal de 1988). Por outro lado, o princípio da anualidade eleitoral, dada a excepcionalidade do momento, pode sofrer mitigação, vez que não represente óbice à reforma constitucional, ainda mais quando se tem situação em que não se pretende aboli-la, mas mitiga-la excepcionalmente.


O resultado desse imbróglio é que o Congresso Nacional promulgou a Emenda Constitucional nº 107/2020 pois, para que fosse possível a eleição esse ano, seria necessária a alteração constitucional, com expressa previsão de inaplicabilidade da regra da anualidade, conforme previsão expressa no art. 2º da referida emenda.


Sendo assim, a Emenda Constitucional 107/2020 afastou a regra da anualidade, que não é cláusula pétrea, diferente da periodicidade do voto, a qual permaneceu hígida. De modo que as eleições foram prorrogadas para 15 e 29 de novembro.


Caso haja necessidade de adiamento maior em determinado município, a Emenda Constitucional nº 107 prevê ainda que, após pedido do Tribunal Superior Eleitoral, instruído por documento de autoridade sanitária, o Congresso Nacional deverá aprovar um decreto legislativo para remarcar o pleito, tendo como limite o dia 27 de dezembro.


Fato é que não há solução fácil quando os dilemas envolvem o poder de reforma da Constituição Federal, contudo, a saída, para esse caso concreto, foi a edição da Emenda Constitucional acima mencionada.

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